Observatório Monteiro Lobato

Observatório Monteiro Lobato

Nota: Este artigo foi escrito a partir de diversas entrevistas concedidas via WhatsApp pela professora Vanete ao jornalista Ricardo Aguiar, autor deste artigo, em novembro do ano passado. Nestas entrevistas, a professora Vanete explicou sobre a gênese do grupo e a especificidade e originalidade da linha de pesquisa sobre a questão do não-racismo [1] na obra do escritor. O Grupo Observatorio Lobato parte do pressuposto de que Lobato não era racista.

Atualmente, temos conhecimento de dois grupos de estudos que se dedicam a pesquisar a vida e a obra de Monteiro Lobato; o grupo Lobato em Rede, liderado pela professora Milena Martins e o grupo Observatório Lobato, que tem como sua principal coordenadora a professora Vanete Santana Dezmann.

Para entender o surgimento do grupo, é preciso fazer uma conexão a outros dois movimentos nascidos da iniciativa da professora Vanete Santana-Dezmann e do professo John Milton: as Jornadas Monteiro Lobato e os Encontros com Lobato. O primeiro surgiu em 2019, com a realização da primeira Jornada nos dias 17 e 18 de dezembro daquele ano na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, reunindo presencialmente pesquisadores de temas relacionados a Lobato e sua obra.

No início de 2021, a professora Vanete e o professor John, criaram, a partir das Jornadas, os Encontros com Lobato – uma série de palestras, debates e entrevistas mensais também dedicadas ao autor e sua obra e que trouxe para o grupo o professor Sílvio Tamaso D’Onofrio, pesquisador não apenas de Lobato, mas também de Edgar Cavalheiro, biógrafo do autor, e a pesquisadora, bacharel em Letras, Taís Diniz Martins.

Assim, na esteira desses eventos, foi nascendo o grupo de estudos Observatório Lobato, que é voltado a investigar a questão das acusações de racismo que passaram a envolver o escritor há cerca de 15 anos, tendo como ponto de partida específico a ideia de que o escritor não era racista. O Observatório parte da premissa de que antes de qualquer acusação é preciso que seja feito um estudo aprofundado, detalhado do que estava acontecendo no mundo naquela época e somente a partir daí fazer a correlação entre a obra de Lobato dentro do contexto histórico da época em que viveu.

A única exigência para ser aceito como integrante do Observatório é que o membro seja desprovido de qualquer pré-conceito e esteja disposto a estudar profundamente a vida e a obra do escritor antes de qualquer posicionamento. Todos os resultados desses estudos aprofundados sobre o escritor e sua obra, são sempre debatidos e acatados sejam lá quais forem. Ainda sobre seus integrantes, não há um processo específico de seleção. Eles não necessariamente precisam ser do meio acadêmico, mas obrigatoriamente devem se apresentar desprovidos de qualquer pré-julgamento, precisam chegar no grupo sem acusar Lobato e sua obra de racismo.

Nós normalmente não escolhemos as pessoas, elas chegam até nós. As pessoas nos procuram e dizem eu gostaria de fazer parte do grupo tal e normalmente nós analisamos o currículo da pessoa, não com caráter eliminatório, apenas para saber onde ela poderá se encaixar melhor. Nós procuramos entender quais são os interesses dessa pessoa, o que pode ser mais útil para ela, quais os benefícios que ela poderá ter ao fazer parte do grupo e daí nós marcamos uma conversa para deixar claro que nós não temos preconceito e não queremos no grupo pessoas que tenham preconceito. Por fim nós conversamos, já vemos qual pode ser a função da pessoa dentro do grupo de acordo com o que for interessante para ela e para o próprio grupo”, explica a Dra. Vanete Santana-Dezmann.

O grupo se reúne desde o início do ano passado, sem uma frequência pré-estabelecida e as reuniões acontecem sempre que necessário. Em geral no começo do ano, quando o grupo precisa definir quais serão as pesquisas para o decorrer do ano, depois no meio do ano, quando é necessário analisar o andamento das pesquisas, e no final do ano, para organizar as o evento anual Jornadas Monteiro Lobato. Além disso, o grupo também se reúne informalmente uma vez por mês, sempre numa quarta-feira, nos chamados Encontros com Lobato, transmitidos pelo canal da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, no YouTube. Os integrantes do Observatório têm total liberdade para desenvolverem suas pesquisas conforme a sua disponibilidade de tempo, não havendo um cronograma pré-estabelecido para a conclusão de cada estudo.

“O principal objetivo do grupo é analisar a obra de Monteiro Lobato, estabelecendo as correlações com sua biografia e com o momento histórico, com base em profundas e detalhadas investigações, por muitas vezes parecendo aquele trabalho investigativo desenvolvido por detetives. Isso é necessário para descobrir elementos, fatos, detalhes que muitas vezes estão lá, em livros de história, mas que acabam passando despercebidos até mesmo aos olhares mais atentos.” “Um exemplo clássico é que todas as pessoas que escreveram sobre o livro O presidente Negro, escreveram que a obra é tão racista que nem os norte-americanos quiseram publicá-lo. A partir de uma pesquisa de detetive eu descobri que o livro não foi publicado porque a mecenas da literatura, de todas as artes, mas sobretudo da literatura em Nova York, nos anos 1920 e 1930, era filha da Madame CJ Walker e essa moça, A'Lelia Walker, era a herdeira da fábrica de alisante de cabelo Madame CJ Walker. Quer dizer, o problema não estava no livro, mas estava em quem financiava, quem bancava os editores nos Estados Unidos na época. Então informações como essas estavam presentes ali o tempo todo, mas ninguém tinha olhado para ela. Ninguém tinha estabelecido essa relação e um dos principais objetivos do nosso grupo é justamente estabelecer as relações”, explica a professora Vanete nesta entrevista concedida em novembro do ano passado.

As pesquisas concluídas têm seus resultados apresentados na forma de palestras nos Encontros com Lobato ou nas Jornadas Monteiro Lobato, dependendo da época em que ela é concluída. Além da apresentação em palestras, o material normalmente é transformado em artigo, indo para um dossiê do Observatório, para o livro das Jornadas Monteiro Lobato ou ainda para outro meio de divulgação de trabalho científico.

No site do Observatório você encontra uma lista com vários trabalhos realizados pelo grupo, entre eles, destaque para a análise de O Presidente Negro, publicada no livro chamado Entre Metafísica a Distopia e Mecenato, escrito pela professora Vanete Santana-Dezmann e publicado no ano passado. Outro trabalho interessante é a tradução de Reinações de Narizinho para o alemão, livro publicado também no final do ano passado na Alemanha. Ambas as obras foram lançadas no Brasil em 2022.

Para saber mais sobre o Observatório Monteiro Lobato, conhecer os membros do grupo e os trabalhos já realizados, basta acessar o site: https://www.observatoriolobato.org/

Se você é uma pessoa que aprecia a boa literatura, destituída de preconceito e que está disposta a investigar o universo lobatiano com o objetivo de trazer à luz o autor e sua obra sem filtros, vale muito a pena conhecer o trabalho do Observatório Lobato e quem sabe integrar esse respeitadíssimo grupo de pesquisa sobre um dos mais brilhantes e aclamados escritores brasileiros.

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REFERÊNCIAS:

Texto escrito com base em pesquisa ao site https://www.observatoriolobato.org/ e entrevistas via Whatsapp, concedidas pela professora Vanete Santana-Dezmann ao autor  deste artigo, o jornalista Ricardo Aguiar, em novembro de 2022.