RESUMO: Em tempos de uma grande imersão nos smartphones e nos tablets, temos observado que os professores vêm encontrando dificuldades para envolver seus alunos na leitura de obras literárias. Diante desse cenário, no qual os livros concorrem com os dispositivos móveis, tomamos como exemplo a figura de Dona Benta – personagem das histórias infantis de Monteiro Lobato – com o objetivo de refletirmos sobre o papel do mediador de leitura na contemporaneidade: não somente aquele que apresenta os textos, mas também convida os leitores a olharem para o universo que os circunda. Para tanto, neste artigo, abordaremos a performance da avó de Narizinho e Pedrinho, particularmente, em Geografia de Dona Benta (1935) e em D. Quixote das crianças (1936), e, depois, inspiradas nessa prática de formação, proporemos estratégias de mediação alinhadas à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para trabalhar com os livros citados, a partir do uso de recursos digitais, no 6º ano do Ensino Fundamental.
PALAVRAS-CHAVE: Dona Benta; Literatura; Mediação; Recursos Digitais.
ABSTRACT: In times of great immersion in smartphones and tablets, we have observed that teachers have found great difficulty in involving their students in reading literary works. In view of this scenery, in which books compete with mobile devices, we have as an example the figure of Dona Benta – a character in Monteiro Lobato children’s stories – with the aim of reflecting on the role of the mediator of reading in contemporary times: not only the one who presents the texts, but also the on who invites readers to look at the universe that surrounds them. Therefore, in this article, we will discuss the performance of Narizinho and Pedrinho’s grandmother, particularly in Geografia de Dona Benta (1935) and in D. Quixote das Crianças (1936), and then, inspired by this training practice, we will propose strategies of mediation – aligned with the National Common Curricular Base (BNCC) – to work with the books cited, using digital resources, in the 6th year of elementary school.
KEYWORDS: Dona Benta; Literature; Mediation; Digital Resources.
INTRODUÇÃO
Qualquer adolescente de hoje em dia sabe que um PC é um computador pessoal […] No
entanto, para os homens da minha geração […] PC significava Partido Comunista. Hoje, PC serve de bandeira para um outro movimento revolucionário e, como quase sempre nesses casos, são jovens quem o encabeçam. Trata-se da revolução digital, informática, ou seja lá que outro nome se queira dar a ela, que há uma década vem sacudindo a humanidade.
Juan Luis Cebrián
Segundo Morin (1997a, p. 147), “numa sociedade em rápida evolução e, sobretudo, numa civilização em transformação acelerada como a nossa, o essencial não é mais a experiência acumulada, mas a adesão ao movimento”. Por isso, neste artigo, cientes do quão urgente se faz sintonizar as nossas práticas docentes à atual concepção de realidade que vem sendo esculpida, propomos discutir sobre estratégias de mediação, em tempos de tecnologias digitais da informação e comunicação, as chamadas TDICs, a partir da forma como Dona Benta explora o universo da leitura em duas obras infantis de Monteiro Lobato, Dom Quixote das Crianças (1936) e Geografia de Dona Benta (1935). A nossa tese de que essa personagem deva ser tomada como uma espécie de modelo de mediadora de leitura, em sala de aula no século XXI, alicerça-se em dois pontos. Primeiramente, no fato de Dona Benta apresentar, enquanto leitora proficiente dos mais variados assuntos, os livros às crianças de maneira instigante, envolvendo-as em reflexões complexas não só a respeito da construção dos sentidos presentes nos textos, mas também sobre os diversos conhecimentos que os perpassam, pois, conforme nos esclarece Lajolo (2005, p. 103), ao abordar o projeto de leitura, de tradução e de adaptação de Dom Quixote das crianças”, “o leitor encontra material bastante rico para reflexão sobre questões de leitura, de leitura dos clássicos, da adequabilidade de certas linguagens a certos públicos, do papel a ser representado pelo adulto responsável pela iniciação dos jovens na leitura e mais miudezas.” Cardoso (2008, p. 290 e 291) nos conta que, em Geografia de Dona Benta, Monteiro Lobato também “idealizava um projeto educacional democrático, autônomo, capaz de formar leitores críticos, preparando-os para vida” e, por isso, não escondia das “crianças as guerras, bem como suas causas, a necessidade de poder e dominação, características tão marcantes do ser humano”. Contudo, vale sublinharmos que essas propostas de formação humana, evidenciadas no modo como a avó-leitora-mediadora conduz os serões, nem sempre foram compreendidas, acarretando a proibição das obras lobatianas em várias escolas, ainda no tempo em que Lobato era vivo. O segundo ponto é a noção de que “a literatura é um mundo aberto ao mesmo tempo às múltiplas reflexões sobre a história do mundo, sobre as ciências naturais, sobre as ciências sociológicas, sobre a antropologia cultural, sobre os princípios éticos, sobre política, economia, ecologia…” (MORIN, 1997b, p. 67). Nesse sentido, compreendendo a literatura “[…] não só como um produto da imaginação criadora do homem, mas também como um meio de problematizar o real – uma espécie de ‘encruzilhada’ por onde passam e se cruzam todos os ‘caminhos’ que formam o ‘mapa’ da sociedade” (COELHO, 2000 p. 28, grifos da autora), iremos sugerir também possibilidades de se trabalhar os dois livros em questão, no 6º ano do Ensino Fundamental, a partir do uso do recursos digitais integrados, como prevê a Base Nacional Comum Curricular (BNCC).
DONA BENTA, A PERSONAGEM MEDIADORA DE LEITURA NA SAGA INFANTIL LOBATIANA
Uma senhora que respeitava os livros. Isso mesmo. Uma personagem leitora e mediadora de leitura. Falamos aqui de Dona Benta, personagem-avó das obras infantis de Monteiro Lobato. Dona Benta aparece já em A menina do Narizinho Arrebitado, em 1920-1921. Mas não é ainda a senhora que conhecemos. Apenas em 1931, com a publicação de Reinações de Narizinho, é que os leitores vão se deparar com a avó que será a mediadora de textos para toda a turma do Sítio do Picapau Amarelo ao longo da saga de mais de vinte volumes. Vejamos Dona Benta nestes dois textos separados no tempo por 10 anos:
A menina do narizinho arrebitado (1920/21) (Edição Fac-similar, 1982)
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Reinações de Narizinho (1931)
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Naquela casinha branca, — lá muito longe, mora uma triste velha, de mais de setenta anos. Coitada! Bem no fim da vida que está, e trêmula, e catacega, sem um só dente na boca – jururu… Todo o mundo tem dó dela: – Que tristeza viver sozinha no meio do mato… Pois estão enganados. A velha vive feliz e bem contente da vida, graças a uma netinha órfã de pai e de mãe, que lá mora desde que nasceu. (LOBATO, 1982, p. 3)
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Numa casinha branca, lá no sítio do Picapau Amarelo, mora uma velha de mais de sessenta anos. Chama-se Dona Benta. Quem passa pela estrada e a vê na varanda, de cestinha de costura ao colo e óculos de ouro na ponta do nariz, segue seu caminho pensando:
– Que tristeza viver assim tão sozinha neste deserto…
Mas engana-se. Dona Benta é a mais feliz das vovós, porque vive em companhia da mais encantadora das netas – Lúcia, a menina do narizinho arrebitado, ou Narizinho como todos dizem. (LOBATO, 1977, p. 9)
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Como vimos no quadro acima, Dona Benta nasce sem nome e parece estar já no fim da vida, trêmula, catacega e sem dentes na boca. Nem de perto essa descrição assemelha-se à personagem que hoje conhecemos nas obras do Sítio do Picapau Amarelo. Como poderia aquela personagem, com tal caracterização, participar de todas as aventuras que tinham passado pela cabeça de nosso escritor? Dona Benta precisava de mais tempo de vida e de mais vivacidade.
Eis que uma década e muitos outros pequenos textos com aventuras da turma, no meio do caminho, serviram para que Lobato percebesse a necessidade de rejuvenescer a avó. Pois foi o que o leitor passou a encontrar em 1931, com a publicação de Reinações de Narizinho. Nele, a senhora recebe um nome, Benta, e tem pouco mais de sessenta anos. É ativa, gosta de costurar e usa óculos de ouro no nariz, o que nos faz deduzir que se trata de alguém com alguma posse. De acordo com o trecho apresentado anteriormente, ela vive contente (“mais feliz das vovós”), pois mora em companhia de Lúcia (“mais encantadora das netas”). Por meio dessa reelaboração do texto, o escritor traz, então, certa delicadeza à obra, antes bem mais sisuda, talvez por conta da avó catacega e da neta órfã de pai e mãe.
Esse tom mais leve e carinhoso é o que reverberará na cabeça de todo leitor de Lobato quando conhece Dona Benta. Para nós, professores de literatura, conhecê-la significa também admirá-la não só como uma grande leitora que ela é, mas também mediadora de leitura em que se torna. Explicamos. Dona Benta, apaixonada pelo ato de ler, empresta as suas competências leitoras para os leitores em formação.
Dona de uma imensa biblioteca, já leu e releu exemplares importantes de textos que compõem a história da humanidade. Um desses muitos livros é Dom Quixote, de Cervantes, em dois enormes volumes, os quais se tornam mote para que Emília e os netos peçam a ela que lhes conte a história do herói da Mancha. Assim como leitora de Quixote, ela é também de Peter Pan e de Hans Staden, outros dois clássicos da literatura que, junto com o texto cervantino, serão recontados para os netos.
Atenta sempre à importância da leitura, ela oferta os mais variados assuntos e os estimula a imersão nos textos para, futuramente, quando desenvolverem as habilidades leitoras esperadas, busquem os textos originais dos quais ela reconta as histórias ou sobre os quais faz comentários críticos ou ainda ouve e comenta os comentários dos netos e dos bonecos Emília e Visconde.
Como mediadora de leitura, Dona Benta é capaz de se inserir entre o texto lido (ou recontado) e o ouvinte, ajudando-o a entender as relações entre ambos. Por isso, em seus serões, faz questão de que seus netos dialoguem com ela e perguntem sempre que alguma dúvida surgir. Seu vasto e rico repertório de leitura faz com que ela seja respeitada e valorizada, em especial, pelos próprios netos e também pelos outros moradores do Sítio. Além de recontar clássicos literários, também aproveita seus serões para recontar e mediar a história do mundo e sua geografia (a partir de uma viagem imaginária que ela e a turminha empreendem a bordo do navio “O Terror dos Mares”). Também ajuda o Visconde a explicar como se faz a exploração do petróleo no Sítio e faz experiências e as explica em História das Invenções. Vejamos:
de, no futuro, ler o texto em sua versão completa. Trata-se de uma importante competência mediadora a percepção de que o mediador é uma “ponte” temporária entre o texto e seu leitor. Ele está ali apenas como facilitador, naquele momento, de distâncias históricas, linguísticas ou estilísticas. Vemos muito bem essa competência de Dona Benta nos exemplos de texto em que ela se preocupa com a leitura futura das crianças (ROMANO, 2019, p. 161).
Sensível às competências de leitura de seus ouvintes, a avó-leitora-mediadora encontra alternativas, geralmente eficazes, para mediar os textos para os netos e demonstra traquejos que contribuem para que as crianças gostem das histórias, queiram escutá-las, compreendê-las e discuti-las (e por que não, relê-las no futuro), acabando por torná-las, até mesmo, parte da própria realidade delas.
Essa era a Dona Benta personagem do início do século XX. E hoje, nos vinte primeiros anos do século XXI, em plena revolução digital, continuam atuais as táticas de reconto de textos e a performance como mediadora de leitura da carismática Dona Benta? No momento em que vivemos, quando se fala tanto em TDICs e BNCC, como a personagem inspira processos de mediação antenados ao século XXI?
A EDUCAÇÃO EM TEMPOS DE REVOLUÇÃO DIGITAL
A sociedade, nos últimos séculos da grande marcha humana, vem sofrendo profundas e céleres transformações, o que, consequentemente, esculpe novos paradigmas nos modos de ser, pensar, sentir, agir e se comunicar. Com o advento da internet e a popularização dos microcomputadores, temos percebido de forma ainda mais evidente essas mudanças, como é o caso da Web 1.0, Web 2.0, Web 3.0 e já se fala em Web 4.0.
De acordo com Santaella (2007, p. 195), “se prestarmos a atenção [no transcurso de apenas dois séculos], ficará perceptível que grande parte dessas invenções é constituída por tecnologias que incrementam a capacidade humana para a produção de linguagem.” Segundo a autora, essas tecnologias (info)comunicativas podem ser classificadas em cinco gerações, as quais produzem formas de culturas específicas, embora o surgimento de uma formação cultural não anule as outras, visto que ocorre a sobreposição e a complexificação nos modos de coexistência, como veremos a seguir:
CULTURAS
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ÂMBITOS
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TECNOLOGIAS
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MÍDIAS
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TRAÇOS
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industrial
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eletromecânica
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do reprodutível
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jornal, foto e
cinema
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reprodutibilidade
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de massa
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eletroeletrônica
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da difusão
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rádio e televisão
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transmissão
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das mídias
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narrowcasting
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do disponível e do descartável
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para audiências específicas
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segmentação
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cibercultura
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teleinformática
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do acesso
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digitais
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interatividade
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da mobilidade
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comunicação móvel
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da conexão contínua
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locativas
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portabilidade
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A convivência imbricada desses cenários culturais midiáticos demarca, dos anos 1990 para cá, o início do que chamamos hoje de revolução digital e isso, no que se refere ao universo da literatura, não impacta somente a maneira como se produzem e se divulgam os textos literários, mas também o jeito de lê-los e mediá-los.
Há pouco tempo, a gigante editorial americana Simon & Schuster ditou novas regras para seus escritores. E quais seriam elas? Abrir um blogue. Criar uma página no Facebook. Gerar conteúdo em redes sociais literárias. Interagir. Contaminar-se. Sair dos escritórios empoeirados ou da pretensa redoma criativa. Abrir-se para as novas exigências e imperativos de uma época de cibercultura. Tudo isso posto em contrato (CRUZ, 2012, p. 32).
Nas instituições de ensino, também conseguimos notar uma certa mudança: a transição de aulas estritamente centradas na figura do professor-expositor para novos modelos educacionais, cujas dinâmicas colocam os estudantes como protagonistas nos processos de aprendizagem. Esse movimento, apesar de vir caminhando a passos lentos, desponta, cada vez mais, com a adoção de percursos metodológicos personalizados a partir do uso integrado das tecnologias digitais.
Nesse sentido, como bem destaca Lévy (1999, p. 171, grifos do autor) ainda no século XX:
[…] a principal função do professor não pode mais ser uma difusão dos conhecimentos, que agora é feita de forma mais eficaz por outros meios. Sua competência deve deslocar-se no sentido de incentivar a aprendizagem e o pensamento. O professor torna-se um animador da inteligência coletiva dos grupos que estão a seu encargo. Sua atividade será centrada no acompanhamento e na gestão das aprendizagens: o incitamento à troca, a mediação relacional e simbólica, a pilotagem personalizada dos percursos de aprendizagem etc.
Por isso, compartilhando da mesma opinião de Martín-Barbero (1996, p. 19, grifos do autor) sobre o quanto as tecnologias digitais de comunicação e informação trazem um grande desafio para a sala de aula, haja vista que “apenas a partir da compreensão da tecnicidade midiática como dimensão estratégia da cultura que a escola pode inserir-se [verdadeiramente] nos processos de mudanças que atravessam a nossa sociedade”, retomamos as orientações da BNCC com o objetivo de propormos mais adiante – à moda de Dona Benta – possibilidades de mediação de leitura, no 6º ano Ensino Fundamental, a partir do uso de recursos digitais.
BNCC E TDICS, UMA PROPOSTA DE TRABALHO COM A LITERATURA EM SALA DE AULA
Não adianta a tecnologia reforçar o processo educativo tradicional. É preciso, antes
de mais nada, repensar a educação. Repensar a educação e repensá-la a partir dos
próprios educandos e, a partir daí, pensar um novo desenho do processo educativo, ver o
replanejamento desse processo e verificar para que pode servir a tecnologia.
As diretrizes da BNCC buscam garantir, ao longo da Educação Básica, aprendizagens essenciais para o século XXI. De acordo com essas prescrições, os alunos devem ter assegurado o desenvolvimento de dez competências gerais que se consubstanciam em direitos éticos, estéticos, políticos e de aprendizados. Vale sublinharmos que tais competências só poderão ser alcançadas plenamente se houver a “mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para desenvolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho” (BRASIL, 2018, p. 8).
Para pensarmos em como é possível, ainda hoje, nos inspirarmos nos processos de mediação de leitura da nossa personagem-avó-leitora e, ainda por cima, ir ao encontro dos preceitos da BNCC, pontuamos, aqui, cinco competências gerais que dialogam com nossas sugestões de trabalho:
TÍTULOS
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COMPETÊNCIAS
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pensamento científico, crítico e criativo
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Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas.
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senso estético
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Valorizar e fruir as diversas manifestações artísticas e culturais, das locais às mundiais, e também participar de práticas diversificadas da produção artístico-cultural.
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TÍTULOS
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COMPETÊNCIAS
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comunicação
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Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.
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argumentação
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Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.
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cultura digital
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Argumentar com base em fatos, dados e informações confiáveis, para formular, negociar e defender ideias, pontos de vista e decisões comuns que respeitem e promovam os direitos humanos, a consciência socioambiental e o consumo responsável em âmbito local, regional e global, com posicionamento ético em relação ao cuidado de si mesmo, dos outros e do planeta.
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Se observarmos com atenção as competências gerais listadas acima, perceberemos que elas atravessam todas as áreas do saber e articulam uma formação humana global. Se reconhecermos que “A sociedade na qual estamos inseridos se constitui como um grande ambiente multimodal, no qual palavras, imagens, sons, cores, músicas, aromas, movimentos variados, texturas, formas diversas se combinam e estruturam um grande mosaico multissemiótico” (DIONISIO & VASCONCELOS, 2013, p. 19), constataremos, a partir dessa noção, que “É de suma importância que a escola proporcione aos alunos o contato com diferentes gêneros, suportes e mídias de textos escritos, através, por exemplo, da vivência e do conhecimento dos espaços de circulação dos textos, das formas de aquisição e acesso aos textos e dos diversos suportes da escrita.” (LORENZI & DE PÁDUA, 2012, p. 36). Mas também que “[…] desenvolva as diferentes formas de uso das linguagens (verbal, corporal, plástica, musical, gráfica etc.) e das línguas (falar em diversas variedades e línguas, ouvir, ler e escrever)”(ROJO, 2009, p. 119, grifos da autora), porque só assim podemos formar leitores verdadeiramente proficientes para ler o mundo.
Nesse sentido, trabalhar a literatura não se limita apenas a ler/ouvir e discutir
os sentidos dos textos escritos/impressos, mas também colocá-la em diálogo com outras expressões e produtos da cultura, assegurando, assim, os multiletramentos :
[…] um trabalho que parte das culturas de referência do aluno (popular, local de massa) e de gêneros, mídias e linguagens por eles conhecidos, para buscar um enfoque crítico, pluralista, ético e democrático – que envolva agência – de textos/discursos que ampliem o repertório cultural, na direção de outros letramentos, valorizados (como é o caso dos trabalhos com hiper e nanocontos) ou desvalorizados (como é o caso do trabalho com picho). Além disso, trabalhar com os multiletramentos partindo das culturas de referência do aluno implica a imersão em letramentos críticos que requerem análise, critérios, conceitos, uma metalinguagem, para chegar a propostas de produção transformada, que implicam agência por parte do alunado. (ROJO, 2012, p. 8)
Temos observado que, nos últimos tempos, nas aulas de literatura, o uso dos recursos digitais – como elemento integrador – tem ocorrido das mais diversas formas, desde a leitura da obras literárias até a partilha. É comum, por exemplo, os alunos lerem em uma plataforma virtual, pesquisarem em um dicionário eletrônico, escreverem suas impressões de leitura num blog, produzirem um booktrailer, criarem uma fanfic etc. Neste artigo, contudo, iremos destacar ideias para explorar as ferramentas tecnológicas e potencializar mais os processos de mediação.
POSSIBILIDADES DE MEDIAÇÃO DE LEITURA EM UMA CULTURA DIGITAL
As transformações culturais, as novas condições de produção dos conhecimentos levam
a novos estilos de sociedade nos quais a inteligência é produto de relações entre pessoas e
dispositivos tecnológicos. Mudam, assim, as formas de construção do conhecimento e os
processos de ensino-aprendizagem.
Maria Teresa de Assunção Freitas
O professor, ao fazer a curadoria das obras que serão exploradas em sala de aula, precisa escolher livros que sejam atemporais e que, portanto, favorecem o prazer da leitura. Dentro desse rol, os textos infantis lobatianos, considerados clássicos, podem ser tidos como “atuais” pois, mesmo que escritos no início do século XX, continuam dialogando com a sociedade contemporânea.
Isso não se dá, por exemplo, devido ao fato de Dona Benta aparecer usando computador para enviar e-mail ao neto Pedrinho, como na última versão do Sítio do Picapau Amarelo, veiculada na televisão aberta no início do século XXI, mas sim pela maneira como traz discussões que respeitam a curiosidade e a inteligência das crianças. Nessa senda, acreditamos que, embora as personagens vivam no Sítio e se divirtam de outras formas, bem distantes daquelas experimentadas por uma geração imersa nos smartphones e nos tablets, as histórias convidam os leitores para um olhar de descoberta e muito disso é garantido pela tática de avó aventureira e mediadora de textos.
Uma obra literária mantém-se carregada de frescor, então, quando convida os seus leitores a olharem para si mesmos e para o mundo que os rodeia. Vejamos:
– Estou contando apenas algumas das principais aventuras de D. Quixote, e resumidamente. Ah, se fosse contar o D. Quixote inteiro a coisa iria longe! Essa obra de Cervantes é bem comprida; passa de mil páginas numa edição in-16.
[…]
– In-16, vovó? Que quer dizer isso?
– É uma medida do formato dos livros. Os livros são feitos de papel, como você sabe. O papel vem da fábrica em folhas. Em cada folha imprime-se um certo número de páginas. Espere… O melhor é dar um exemplo. Traga um jornal.
– Pronto, vovó – disse ele. Aqui tem um.
– Muito bem – disse Dona Benta. Vamos agora tomar uma folha inteira e desdobrá-la sobre a mesa, assim. Aqui tem você uma folha de papel. Se dobrarmos esta folha pelo meio, quantas páginas ficam? Página é um lado só do papel. Pedrinho dobrou a folha de papel e contou.
– Ficam 4 páginas.
– Isso mesmo. Ora, se imprimirmos um livro em páginas desse formato, esse livro se chamará in-folio. Agora dobre o papel mais uma vez e veja quantas páginas dá.
Pedrinho dobrou a folha de papel e viu que dava 8 páginas.
– Muito bem. Um livro impresso em páginas desse formato é um livro in-oitavo, ou in-8. Dobre o papel mais uma vez e conte.
Pedrinho dobrou o papel e contou 16 páginas.
– Isso mesmo. Um livro impresso em páginas desse formato é um livro in-dezesseis, in-16. Dobre o papel mais uma vez e conte. […]
– Ora veja só, vovó, uma coisa tão simples e eu não sabia! Vou ensinar a Narizinho (LOBATO, 1957, p. 152 e 153).
Aqui, temos uma “aula” sobre a materialidade do livro: Dona Benta, no papel de mediadora, enquanto apresenta uma síntese das aventuras de D. Quixote, abre espaço para uma conversa sobre as peripécias do herói e, por que não, das crianças no sítio, explorando sempre a relação entre o conteúdo (enredo) e a forma (edição/adaptação). Podemos observar que, mais do que simplesmente responder ao neto sobre o significado de in-16, ela o convida a experimentar as dobras da folha e tirar suas próprias conclusões.
Como mediaríamos essa obra à moda de Dona Benta? Pois bem! Imaginemos que estamos trabalhando D. Quixote das crianças, no formato de e-book, com os alunos do 6º ano do Ensino Fundamental. Em primeiro lugar, sugeriríamos que os alunos usassem o mecanismo de busca do e-reader para conhecer o sentido da expressão in-16. Cientes do que significa, aí sim abriríamos para discutir sobre como fica essa questão na esfera do digital: Será que há uma correspondência visto que a “folha” no e-book é só uma representação gráfica e não o suporte propriamente dito?
Essas reflexões/descobertas seriam compartilhadas em murais colaborativos virtuais, cuja estrutura permite inserir áudios, imagens, vídeos, entre outros, e ainda linkar, curtir, votar, comentar, avaliar e atribuir estrelas as postagens. Notemos que, com essa atividade, estaríamos retomando uma explicação dada por Dona Benta, lá no início do século XX, e lançando – a partir de ferramentas tecnológicas para interação – um olhar sobre a materialidade dos textos contemporâneos, pois, como orienta a BNCC, é preciso:
Ler, escutar e produzir textos orais, escritos e multissemióticos que circulam em diferentes campos de atuação e mídias, com compreensão, autonomia, fluência e criticidade, de modo a se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos, e continuar aprendendo (BRASIL, 2018, p. 87).
Uma segunda proposição seria pedir que os alunos comparassem três versões diferentes da mesma obra: capa comum (1957), e-book (2017) e em quadrinhos (2007) . As duas primeiras referentes à adaptação lobatiana para as crianças, já a terceira, uma transposição desse exemplar literário para os quadrinhos. Os estudantes, após observarem o quanto cada escolha editorial afeta a construção dos sentidos e a experiência leitora, usariam os recursos digitais para fazerem um registro dessas análises (mapas conceituais) e até mesmo para criarem suas leituras em outra linguagem como, por exemplo, a audiovisual (animação em stop motion), exercitando a produção de textos multissemióticos:
Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em
diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao diálogo, à resolução de conflitos e à cooperação (BRASIL, 2018, p. 65).
Quanto à construção dos sentidos, há inúmeras passagens dessa obra lobatiana que poderiam ser exploradas a partir da gravação de um podcast, por exemplo. Com isso, além de avaliarmos a performance leitora, oportunizaríamos uma situação lúdica de aprendizagem, como fazia Dona Benta, nas primeiras décadas do século, XX e vem preconizando a BNCC:
Mobilizar práticas da cultura digital, diferentes linguagens, mídias e ferramentas digitais para expandir as formas de produzir sentidos (nos processos de compreensão e produção), aprender e refletir sobre o mundo e realizar diferentes projetos autorais. (BRASIL, 2018, p. 87)
Vamos a um outro livro de Monteiro Lobato: Geografia de Dona Benta. Escolhemos uma passagem logo do início da obra – quando a avó responde a uma dúvida de Narizinho e incorre na Lei da Gravitação, de Isaac Newton – para refletirmos também quanto a sua exploração a partir do uso das tecnologias digitais:
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Conte essa lei, vovó,
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A Lei da Gravitação diz assim: A matéria atrai a matéria na razão direta das massas e na razão inversa do quadrado das distâncias.
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Fiquei na mesma! – gritou Pedrinho.
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Pois não será difícil compreender, se formos por partes. Diz a lei que a matéria atrai a matéria. Matéria é tudo quanto ocupa lugar no espaço. Você ocupa lugar no espaço; logo você é matéria. Os astros ocupam lugar no espaço; logo os astros são matéria. Emília ocupa lugar no espaço; logo Emília é matéria.
A boneca rebolou-se toda, orgulhosa de ocupar lugar no espaço.
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Mas o espaço é infinito – continuou Dona Benta, isto é, não tem fim; de modo que os astros, por maiores que sejam, não passam de pontinhos ocupando lugarezinhos no espaço infinito. Esses pontinhos, ou películas de matéria atraem-se, ou puxam-se uns aos outros.
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Já sei – disse Pedrinho. Um puxa o outro como o ímã puxa o ferro. O ímã que atrai o ferro é a matéria-ímã atraindo a matéria-ferro.
Continue, vovó.
-Muito bem. A matéria atrai a matéria, mas de que modo? De dois modos. Primeiro, na razão direta das massas…
[…]
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Segundo modo: na razão inversa do quadrado das distâncias. Quer dizer que quanto mais longe um astro está de outro, menos o atrai.
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Sei. Com a distância vai perdendo a força. Isso é lógico. Se o ferro está a um quilômetro do ímã, por força que é menos atraído do que se estivesse a um metro.
[…]
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Compreendi. Continue, vovó.
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Já acabou. É isso só. Um astro atrai outro conforme o tamanho e conforme a distância que está do outro. Quanto maior for o astro, mais atrai, e quanto mais longe estiver, menos atrai. A Lei da Gravitação é isso (LOBATO, 1957, p. 9 e 10, grifos do autor).
Temos aqui mais um excerto em que Dona Benta faz a ponte entre as crianças e o conhecimento institucionalizado. Com o objetivo de explorarmos a ciência que nem fazia a avó-leitora-mediadora, indicamos o uso Gravity Simulator, uma espécie de convite para experimentar a lei da gravitação com os alunos. Nessa proposta, os estudantes criariam quantas partículas quisessem, definindo tamanho, massa e velocidade, em seguida, visualizariam o trajeto, a colisão e a força de atração entre as partículas desenvolvidas em um campo gravitacional simulado. Mas isso é conteúdo para o 6º ano do Ensino Fundamental? Não podemos esquecer que Lobato nunca teve receio de discutir temas complexos em seus livros infantis. Então, é sim! O importante é trazer o conteúdo de maneira lúdica e o recurso digital integrado ao currículo. Com esta proposição, além de mediar o processo de leitura literária, o professor convoca os leitores a alargarem a percepção e o entendimento sobre os fenômenos do mundo, como recomenda a BNCC:
Analisar, compreender e explicar características, fenômenos e processos relativos ao mundo natural, social e tecnológico (incluindo o digital), como também as relações que se estabelecem entre eles, exercitando a curiosidade para fazer perguntas, buscar respostas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das Ciências da Natureza. (BRASIL, 2018, p. 324)
Uma outra possibilidade é o uso de aplicativos de realidade aumentada. Com o History: Maps of Word, os alunos acessariam diferentes mapas de várias partes do mundo de períodos distintos da história. Já com o Star Chart, identificariam a localização dos corpos celestes mesmo em plena luz do dia. Esses recursos, além de instigar a curiosidade, permitem:
Desenvolver autonomia e senso crítico para compreensão e aplicação do raciocínio geográfico na análise da ocupação humana e produção do espaço, envolvendo os princípios de analogia, conexão, diferenciação, distribuição, extensão, localização e ordem. (BRASIL, 2018, p. 366)
Uma proposta com apelo mais autoral é usar o Scratch, software de programação em bloco. Com ele, os alunos gamificariam histórias e jogos. Não podemos esquecer do Google Earth e do Google Maps que permitiriam realizar atividades riquíssimas no que se refere ao universo cartográfico, como, por exemplo, conhecer mais sobre os muitos espaços geográficos pelos quais a turma do Sítio faz passagem:
Desenvolver e utilizar processos, práticas e procedimentos de investigação para compreender o mundo natural, social, econômico, político e o meio técnico-científico e informacional, avaliar ações e propor perguntas e soluções (inclusive tecnológicas) para questões que requerem conhecimentos científicos da Geografia (BRASIL, 2018, p. 366).
Também podemos sugerir a retextualização e a tradução intersemiótica de algumas passagens do livro. Na primeira opção, os alunos produziriam um novo texto, inclusive com mudança de propósito comunicativo, a exemplo do infográfico, do e-zine e do meme. Na segunda, buscariam equivalências em outras linguagens, como é o caso da história em quadrinhos, do gif e da fotonovela. Nessas atividades, os alunos iriam:
Conhecer e explorar diversas práticas de linguagem (artísticas, corporais e linguísticas) em diferentes campos da atividade humana para continuar aprendendo, ampliar suas possibilidades de participação na vida social e colaborar para a construção de uma sociedade mais justa, democrática e inclusiva (BRASIL, 2018, p. 65).
À lista de possibilidades, acrescentaremos também o uso de questionários online, os quais permitiriam criar uma espécie de gincana literária, em que os alunos responderiam a perguntas referentes ao que foi lido.
Abaixo, para sintetizar, elencamos os nomes de alguns desses recursos digitais apresentados neste artigo:
PROPOSIÇÕES
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RECURSOS DIGITAIS
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animações em stop motion
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AnimatorHD, Dragon StopMotion, Frame by Frame, iStopMotion, StopMotion Station e ZU3D
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gifs
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Giflike, Gif Studio, ImgFlip, Imgur e ImgPlay
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histórias em quadrinhos
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GoAnimation, Pixton, Scribble Press, ReadWriteThink e Stripcreator
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infográficos
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Canva, Genially, Infogram, Pictovia, Piktochart, Venngage e Visme
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mapas conceituais
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Canva, Coggle, Lucidchart, MindMeister, SimpleMind e StormBoard
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memes
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Adobe Spark, Canva, Crello, Meme Generator e Pext
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murais colaborativos
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Mural.ly, Padlet e Popplet
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podcasts
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Adobe Adition, Audacity, CutMP3.net e Spreaker
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questionários online
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Kahoot!, Mentimeter e Socrative
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em tempos de uma grande imersão nos smartphones e nos tablets, traço marcante de uma cultura permeada pela revolução digital, temos observado que os professores vêm encontrando dificuldades para envolver seus alunos na leitura de obras literárias, especialmente, as que apresentam uma grande distância entre o contexto de produção e de recepção. Contudo, acreditando que podemos nos apropriar desses recursos tecnológicos como uma forma de instigar o trabalho com a literatura em sala de aula, apresentamos algumas possibilidades de mediação no presente artigo.
Tomamos a performance de Dona Benta, enquanto avó-leitora-mediadora, como um modelo para elaborar nossas proposições, haja vista que a carismática personagem das histórias infantis lobatianas, sensível às competências de leitura de seus ouvintes, sempre encontrava meios para apresentar os textos às crianças e, assim, convidá-las a refletirem não só a respeito da construção dos sentidos nos textos, mas também sobre os diversos conhecimentos que atravessam as histórias.
“Moderna”, não pelas novas roupagens que vem recebendo em diferentes edições nos últimos anos, Dona Benta nos inspira pelo jeito que promove os livros e medeia as discussões. Por isso, nossas sugestões do uso dos recursos digitais para explorar Dom Quixote das crianças e Geografia de Dona Benta, no 6º ano do Ensino Fundamental, nunca se tratava de uma concepção encantada com o em si tecnológico, mas de uma tentativa de mobilizar diferentes áreas do saber para alargar o olhar de descoberta, formando leitores verdadeiramente proficientes para ler o mundo, como espera a BNCC e fazia a referida avó-leitora-mediadora.
Paulo Freire (1987, p. 79) dizia que “Ninguém educa ninguém, nem ninguém se educa a si mesmo, os homens se educam em comum mediados pelo mundo” e o mundo, hoje, é aquele em que vivemos na mudança da mudança, onde tudo se forma e se transforma frente a nossos olhos (TIBIJOY, 2008). Logo, sem preconceitos e medo de tentar, revimos nossas posturas docentes, considerando aprender a reaprender e pensando em formas, à moda de Dona Benta, de possibilitar uma educação centrada no protagonismo do aluno.
REFERÊNCIAS
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