Lobato vai ao cinema

Por Antonio Silvio Lefèvre – intérprete de Pedrinho no “Sitio do Pica Pau Amarelo”, TV Tupi, 1953

No final da década de 1940, um ano e meio após o falecimento de Lobato em 04 de Julho de 1948 os apaixonados por sua obra sonhavam em vê-la no cinema.  Faltava, contudo, onde e como fazer isso. Afinal, a televisão não havia ainda chegado ao Brasil (faltava pouco: a TV Tupi seria inaugurada em setembro de 1950) e, além dos livros, o que de mais importante existia era o teatro, com produções e artistas já famosos, como Procópio Ferreira, Maria Dela Costa, Henriette Morineau e muitos outros. O cinema era mais recente, até porque a primeira sala de maior porte em São Paulo, o Cine Metro, no centro da cidade, havia sido inaugurada em 1938, por iniciativa do representante da Metro Goldwin Mayer (MGM) no Brasil, meu avô materno Benjamin Fineberg. Neste cinema e nos poucos outros abertos por ele e por concorrentes, nos anos seguintes, predominavam então os filmes americanos, de Hollywood, pois quase nada havia ainda de produções nacionais: apenas alguns documentários e, na ficção, o foco era nas chanchadas. Pois foi justamente no final dos anos 1940 que se começou a produzir cinema no Brasil, sendo fundados dois importantes estúdios cinematográficos, quase ao mesmo tempo: a Companhia Cinematográfica Vera Cruz, em novembro de 1949 e a Cinematográfica Maristela, em agosto de 1950.

Arthur Neves, um dos sócios da Editora Brasiliense, a editora então responsável pela obra de Lobato, havia trocado idéias com um jovem, chamado Rodolfo Nanni, que acabara de chegar de Paris, onde havia feito um curso de cinema, sobre a possibilidade de levar a obra de Lobato às telas. E juntos haviam escolhido a primeira obra de Lobato a merecer ser filmada: era o conto infantil O Saci, da série do Sítio do Pica Pau Amarelo.

Artur não teve dúvidas ao escolher o estúdio em que poderia produzi-la. Só podia ser a Cinematográfica Maristela, até porque a mesma havia sido fundada por Mario Audrá Jr, filho de Mario Audrá, um poderoso industrial do ramo têxtil, proprietário da Cia. Fabril de Juta Taubaté S.A. Ou seja, uma família de Taubaté, o berço de Lobato, certamente sensível à importância de sua obra e que deveria adorar a ideia de transformá-la em cinema.

A própria denominação “Maristela” estava fortemente vinculada à região de Taubaté, pois era o nome de uma fazenda localizada num município próximo, Tremembé, que Mario Audrá pai havia comprado, em 1931, de monges trapistas franceses que tinham desistido de sua missão de converter brasileiros… e tinham voltado para a França.
Era o início de 1951 quando Arthur Neves, Rodolfo Nanni e o então novato cineasta Nelson Pereira dos Santos iniciaram os preparativos para produzir O Saci. Só que a Cinematográfica Maristela, recém-fundada, não tinha ainda todos os recursos, humanos e materiais, para produzir o filme como um todo. A equipe de Nanni realizou então o que, em cinema, se denomina uma “produção independente”. Ou seja, alugou equipamentos que a Maristela tinha acabado de adquirir e bancou todos os custos da realização do filme, com as filmagens se iniciando em outubro daquele ano.

Paulo Matozinho interpretou o personagem principal, o Saci, e o fez tão bem que seria chamado, em 1952, para interpretar o mesmo personagem na primeira versão do Sítio do Pica Pau Amarelo na TV Tupi, recém fundada. Os outros atores do filme foram: Lívio Nanni, filho de Rodolfo Nanni, fez o Pedrinho; Otávio Araújo foi o Tio Barnabé; Olga Maria Amâncio, criança de apenas 8 anos, foi a Emília; Maria Rosa Ribeiro fez Dona Benta; Aristéia Paula de Souza foi a Narizinho e Benedita Rodrigues, ex- empregada de Lobato e sua esposa fez a Tia Nastacia.

            Conforme bem descrito na Enciclopédia Itau Cultural, no verbete sobre filme O Saci ,  “A narrativa desdobra-se com as brincadeiras dos meninos. A mesma atenção é dada a elementos que fundamentam o lazer e o trabalho rural, como entoar canções populares, cozinhar no fogão à lenha, estourar pipoca e lavar a roupa no córrego. A trama abre-se com a exposição dos sonhos dos dois protagonistas, netos de dona Benta [Maria Rosa Moreira Ribeiro]. Narizinho [Aristéia Paula e Souza] rememora sua aventura com Escamado, príncipe do Reino das Águas Claras, e Pedrinho [Lívio Nanni] almeja aventurar-se pela mata virgem para caçar um saci.

Emília [Olga Maria], a boneca de pano, não sonha, vive o presente. Cai no riacho durante uma pescaria e passa o resto do filme secando ao sol. Dona Benta e tia Nastácia [Benedita Rodrigues], representam o mundo adulto e temem as empreitadas infantis. Todavia, é tia Nastácia quem diz a Pedrinho que ele deve procurar tio Barnabé [Otávio de Araújo]. Somente o “preto velho”, sabe que saci existe e como capturá-lo. 

Apesar de seguir à risca os ensinamentos de Barnabé, Pedrinho decepciona-se com o resultado: o saci está invisível dentro de uma garrafa. Seu corpo só vai se materializar, na hora do sono do menino. Nesse ínterim, Narizinho torna-se vítima do feitiço da Cuca, que a transforma em uma estátua de barro. Pedrinho torna-se amigo do saci [Paulo Matosinho] e recebe dele a proteção na floresta. Graças ao novo amigo, Pedrinho fica sabendo do desaparecimento da prima e de como exigir da Cuca que a libere.

Duas provas difíceis têm de ser cumpridas: conseguir um fio de cabelo de Irara, mãe das águas, e encontrar uma flor azul. O saci consegue o fio de cabelo e Pedrinho encontra a flor que quebra o feitiço. Narizinho, assim, liberta-se do encantamento e volta para casa. Emília, que secava ao sol, não acredita nas aventuras dos meninos. Para provarem veracidade das histórias, saem atrás do saci, mas ele retorna ao seu lugar de origem, como atesta tio Barnabé. As duas crianças e a boneca despedem-se do amigo e também do espectador, trepados em uma cerca de madeira.

Linhas divisórias, como a da cerca, são recorrentes no filme, representando o limite entre o mundo “real” e a fantasia. Narizinho defronta-se com a Cuca ao ultrapassar uma cerca de arame; Pedrinho sai do campo arado para penetrar na mata virgem e fica frente a frente com o saci quando transpõe um regato. Da mesma forma, a cerca do final do filme reforça a chave dada na abertura: a porteira do sítio se abre, convidando o espectador a penetrar em um mundo rural “verdadeiro” por onde aflora o universo da imaginação”.

Produção custosa e demorada, o filme O Saci acabou sendo lançado em 1953. Considerado a primeira produção infantil importante do cinema brasileiro, ganhou o prêmio que consagrou os melhores filmes brasileiros da década de 1950 e que, não por acaso, recebeu o nome de Prêmio Saci.

Enquanto acontecia a produção independente do Saci, a Cinematográfica Maristela foi se ampliando consideravelmente, montando um grande estúdio no bairro do Sacomã, em São Paulo e preparando-se  para produzir seus primeiros filmes: Presença de Anita, estrelando a já famosa atriz de teatro Tônia Carrero, e também O Comprador de Fazendas, baseado no conto de Monteiro Lobato, do livro Urupês.

Para O Comprador de Fazendas foi contratado um elenco com alguns dos mais consagrados artistas de teatro da época. Entre os quais a dupla Procópio Ferreira e Henriette Morineau, interpretando o casal de fazendeiros falidos, que fizeram de tudo para “enfeitar” a propriedade, a fim de agradar um pretenso interessado em comprá-la e que, no final, revela-se um farsante.. (Na cena da foto, Procópio aparece desafiando o comprador…) O já famoso sanfoneiro Luiz Gonzaga compôs e interpretou A Festa no Arraiá, especialmente para o filme.

O lançamento de O Comprador de Fazendas, ou “avant-première”, como se dizia na época, foi realizado em Taubaté, em homenagem à terra de Lobato e também da família Audrá, proprietária da Maristela. E em São Paulo o filme foi lançado nos melhores cinemas de então, entre os quais  os fundados e administrados por meu avô Benjamin Fineberg, como o cine Metro, Art-Palácio, Lux, Ipiranga e outros. Foi um estrondoso sucesso, que trouxe uma forte injeção de recursos para a Cinematográfica Maristela.

Inseguro quanto à capacidade de Mario Audrá Jr. para administrar um negócio que começava a crescer e já preocupado com o que considerou gastos excessivos com produções caríssimas e várias viagens à Europa para divulgar os filmes recém lançados, seu pai Mario Audrá resolveu “profissionalizar” a cinematográfica e para isso contratou como diretor meu avô, Benjamin Fineberg, o ”homem da Metro” que havia ficado famoso por ter trazido o cinema americano para o Brasil, como um interventor para colocar “ordem na casa”. Descontente com a entrada “deste americano” na Companhia Maristela, sentindo-se inferiorizado,… Mario Audrá Jr. resolveu tirar “férias’ e foi para a Europa, lá ficando por um longo tempo…

Benjamin Fineberg, meu avô, havia nascido em 1895 na Rússia numa família de judeus que havia emigrado para os Estados Unidos em 1904 e considerava-se um legítimo americano. Emigrou para o Brasil em 1915 e ficara muito surpreso de não haver ainda aqui as salas de cinema, como nos Estados Unidos. No início dos anos 1920 foi então para Hollywood, conseguiu a representação da MGM para o mercado brasileiro e, para inauguração dos seus cinemas, ele trouxe de navio, para o Brasil, ao vivo, o famoso leão da Metro, na verdade o filho do leão original e que, em homenagem ao Brasil, havia recebido o nome de Tupy. A propaganda da Metro ficara também famosa por ter sido patrocinadora da exportação do então principal produto do país: o “café do Brasil”. Na foto aparece Benjamin com a então famosa atriz americana Bebe Daniels, posando para a propaganda do café brasileiro.

No início da década de 1950 meu avô Benjamin já estava há alguns anos longe dos cinemas que havia fundado, pois os havia vendido para Luis Severiano Ribeiro, que havia criado uma distribuidora de cinema, a Serrador, que controlaria os principais cinemas do país. Meu avô havia mudado de ramo, tendo adquirido, logo após a guerra, em 1945, os dois principais hotéis das Termas de Lindoya (SP), onde esperava abrir cassinos. Intenção frustrada pela proibição do jogo no Brasil pelo General Dutra, logo após ele ter comprado os hotéis…

Mas meu avô ainda era o representante da MGM e tinha um velho sonho que era não apenas de trazer os cinemas para o Brasil, o que já tinha feito, mas também o de fazer “Hollywood no Brasil”. Ou seja, não apenas vender ingressos de cinema, mas realmente fazer cinema.  A indicação de que seria a hora certa para fazer isso fora dada pela inauguração, com grande pompa, da Cinematográfica Vera Cruz, em fins de 1949. Benjamin julgou então que estava na hora de usar todos os seus contatos em Hollywood para fazer da Maristela uma companhia capaz de deixar a Vera Cruz “no chinelo”. 

Durou pouco a intervenção de meu avô na Companhia Maristela. Em 1954 Mario Audrá Jr. voltou das suas longas férias na Europa, o desacordo entre eles sobre os planos para a companhia foi total e a convivência entre ambos se tornou inviável.  Meu avô desistiu então do seu sonho cinematográfico e resolveu ficar apenas no ramo hoteleiro, agora já como administrador do Grande Hotel de Águas de São Pedro.

Já sem Fineberg, de 1954 a 1958, a Companhia Maristela lançou ainda alguns filmes com super produções, como Quem matou Anabela, A pensão da Dona Stela, Getulio: Glória e Drama de um Povo (logo após o suicídio de Vargas, em 1954) entre outros. Porém um problema que existia desde o começo foi se agravando ano a ano: as receitas provenientes dos filmes, mesmo os de mais sucesso, nunca eram suficientes para cobrir os grandes custos, gerados pela compra de caros equipamentos,  a contratação de artistas famosos e de técnicos estrangeiros e, como diziam então as “más línguas”,  as manias de grandeza e os luxos de Mario Audrá Jr….Enfim, a Cinematográfica Maristela, afogada em dívidas, encerrou suas atividades em 1958.

A Cinematográfica Vera Cruz, sua concorrente, teve problemas semelhantes e  mesmo com grandes sucessos como O Cangaceiro, premiado no Festival de Cannes, também não conseguiu ter bom resultado financeiro e encerrou suas atividades até mais cedo, em 1954. Vera Cruz e Maristela foram duas iniciativas pioneiras do cinema no Brasil. Mas a hora do “cinema novo” no Brasil, só chegou mais tarde, na década de 1960.

Lembro-me de ter visto vários filmes da Maristela no cinema que existia no Grande Hotel Águas de São Pedro, administrado por meu avô Benjamin e onde eu, ainda criança, passava minhas férias. Na noite em que foi passado O Saci meu avô anunciou com pompa, para os hóspedes, no refeitório; “Venham assistir  hoje o filme do saci, do Sítio do Pica Pau Amarelo. E aproveitem para encontrar o próprio Pedrinho do sítio, em carne e osso, que se encontra hospedado em nosso hotel ”.

Urupês, o livro que chacoalhou a literatura brasileira

Definitivamente a publicação do livro “Urupês”, em 1918, o primeiro de Monteiro
Lobato, foi primordial para a explosão de sua fama e para o seu reconhecimento junto aos
intelectuais e personalidades mais importantes do Brasil naquela época, sucesso que ainda
hoje repercute entre leitores das mais variadas classes sociais.
Nessa coletânea de contos, considerada sua obra-prima, o escritor inaugura na
literatura brasileira um regionalismo crítico e mais realista do que o praticado durante
o romantismo, no período anterior. É nesse livro que Lobato presenteia seus leitores, com
um dos mais icônicos personagens da literatura brasileira; o Jeca Tatu, o “sombrio urupê de
pau podre, a modorrar silencioso no recesso das grotas”. Esse típico caipira da época,
marcado pela pobreza, pelo marasmo, pela verminose, e pelo alcoolismo que o tornavam
incapaz de praticar a agricultura até para a sua própria subsistência, já havia aparecido em
um texto escrito por Lobato e publicado no jornal O Estado de São Paulo, intitulado “Uma
Velha Praga” onde o escritor denunciava o antigo costume, ecológica e economicamente
desastroso do caipira de tocar fogo no mato para não ter que trabalhar na limpeza da terra.
Na verdade “Urupês” o livro, tem sua origem numa sequência de fatos que
começou com a morte do avô de Lobato, o visconde de Tremembé, em março de 1911.
Após a morte do avô, Lobato já casado, herda a fazenda São José do Buquira e se muda
com a família para a propriedade, onde passa a viver a experiência de fazendeiro. Lobato
tinha planos para transformar a fazenda em um negócio rentável e assim investiu em
projetos agrícolas audaciosos, importando maquinas e pensando em modernizar tudo. Sua
esposa, Purezinha até tratava da saúde dos caboclos com Homeopatia, na época
considerada como “medicina de ponta”. Porém, três anos depois, em 1914, explodiu a
primeira guerra mundial na Europa e o escritor começa a sentir os efeitos daquele momento
com o empreendimento não rendendo o esperado.
Para piorar a situação, naquele mesmo ano, temos um inverno extremamente seco e
Lobato sofre com as constantes queimadas praticadas pelos caboclos da região do Vale do
Paraíba. Indignado com a situação, ele resolve escrever uma carta para a seção de queixas
e reclamações do jornal O Estado de São Paulo, intitulada “Uma Velha Praga”. O contexto
e a narrativa da carta descreve de maneira arrasadora aquela situação, os animais mortos e
o aponta como sendo culpados os caboclos Manoel Peroba, Chico Marimbondo e o Jeca
Tatu (nomes genéricos que o escritor usou para ilustrar o “culpado”), O artigo chamou a
atenção dos editores do diário, que decidiram então publicar a carta como um artigo, fora da
seção pretendida inicialmente, 12 de novembro no dia de 1914.
Esse texto gerou enorme impacto e polêmica junto aos leitores, transformando o
escritor numa figura notável publicamente pela postura crítica ao comportamento predador
do caipira brasileiro, rompendo com a tradição que se mantinha de se romantizar a vida
rural, tão arraigada na cultura da época. A fim de levar adiante o debate sobre a
depredação do meio-ambiente e a atitude predatória do caipira paulista, Lobato escreve
“Urupês”, outro texto contundente, também publicado no jornal O Estado de São Paulo,
no dia 23 de dezembro do mesmo ano (1914), pouco mais de um mês após “Uma Velha
Praga”.
Se no artigo inicial Lobato denunciou as queimadas como um modo fácil e prejudicial
de limpar a terra a ser lavrada, em “Urupês”, ele usa a imagem do caboclo parasita
para caracterizar a indolência, a preguiça e a falta de iniciativa da população agrícola, sem
instrução, especialmente nas regiões decadentes após o apogeu do cultivo do café do Vale
do Paraiba. Na esteira do sucesso de sua primeira abordagem sobre o tema, neste segundo
texto Lobato investe com mais segurança na definição do personagem que caracteriza o

caboclo, na sua visão, o responsável por muitos dos males da agricultura brasileira daquele
período.
Apesar da frustração pessoal, a experiência na fazenda São José do Buquira acabou
sendo decisiva para o nascimento dos artigos “Uma Velha Praga”, e em seguida “Urupês”
e na sequência, a publicação desses textos no jornal O Estado de S. Paulo, foi decisiva para
a entrada de Monteiro Lobato no grupo de colaboradores do jornal e tambem pelo seu
reconhecimento público como figura intelectual de peso após a publicação do seu livro mais
famoso “Urupês”.
Em 1917 Lobato decide vender a fazenda e após uma breve passagem por
Caçapava, onde funda a revista Parahyba, se muda com a família para a capital paulista,
para uma casa alugada na rua Formosa. O escritor compra então a Revista do Brasil com o
dinheiro da venda da fazenda do Buquira.

De acordo com Edgard Cavalheiro, amigo e biógrafo de Lobato, foi o jornalista
Plínio Barreto, do jornal O Estado de S. Paulo, que sugeriu ao escritor a publicação de um
livro reunindo esses contos e crônicas que ele costumava escrever. Lobato se convenceu da
idéia e chegou a cogitar intitular o livro de “Doze mortes trágicas”, pelo fato da maioria dos
contos selecionados para a publicação, terminar de forma trágica, porém acabou optando
por chamá-lo de “Urupês”, título do conto que fecharia o volume.
E foi assim, que alguns meses depois, em 1918, com capa de José Washington
Rodrigues, quatorze contos originalmente e ilustrações do próprio Monteiro Lobato, que a
primeira edição de “Urupês” chegava as livrarias, com mil exemplares, pelos cálculos do
autor, quantidade suficiente para com sorte, ser vendida em cinco anos. Porém para
surpresa geral, a primeira edição foi toda vendida no primeiro mês! Curiosidade: Nesta
primeira edição temos somente o conto “Urupês”, Monteiro Lobato só inclui o conto “Uma
Velha Praga” a partir da segunda edição. O sucesso do livro foi tão grande que no mesmo
ano “Urupês” teve mais duas edições no mesmo ano.
O sucesso de “Urupês” já era uma realidade quando, no ano seguinte, Rui Barbosa,
candidato a presidente da República, durante a acirrada campanha eleitoral da época,
perguntou em meio a uma de suas reuniões públicas, realizada no Teatro Lírico do Rio de
Janeiro, se o país conhecia “aquele tipo de raça, que, entre as formadoras da nossa
nacionalidade, que se perpetua a vegetar de cócoras, incapaz de evolução e impenetrável
ao progresso” citando o personagem criado por Lobato. Isso assegurou à “Urupês” um lugar
no panteão de best-seller absoluto com suas histórias transformadas em filmes e traduzidas
para diversos idiomas.
Em 1º de maio, 1919 Lobato escreveu ao seu amigo Rangel: “O discurso de Rui foi
um pé de vento que deu nos Urupês. Não ficou um para remédio dos 7 mil! Estou
apressando a 4ª edição que irá do 8º ao 12º milheiro. Tiro-as, agora, aos 4 mil. E isto antes
de um ano, hein? O livro assanhou a taba — e agora, com o discurso do Cacique-mor, vai
subir que nem foguete”. Não apenas Rui Barbosa, mas inúmeras personalidades da época
passaram a exaltar o talento de Lobato, personalidades como Agripino Grieco, Alceu
Amoroso Lima, Mário de Andrade e Oswald de Andrade, apenas para citar algumas. Sem
rodeios, nem medo de errar, Gilberto Freyre foi enfático em afirmar que identificou em
“Urupês” um fenômeno sem precedentes, enxergando na obra um ponto de partida, um
caminho aberto aos que viriam depois. “Mário e Oswald de Andrade, José Américo, Amando
Fontes, Lúcio Cardoso, Jorge Amado, Raquel de Queiroz, José Lins do Rego, Luiz Jardim e
vários outros, ao aparecerem, encontraram o sulco de Lobato” declarou ele.
Já consolidado como escritor e editor, Lobato lançou em 1921 uma versão popular do
seu livro, vendido a um terço do preço da obra original, com o objetivo de torná-la acessível
a mais leitores. Esse foi o primeiro título da Coleção Brasília, que em sua sétima edição
bateu a marca dos 21 mil exemplares!

É com este legado, que “Urupês” mantém há décadas um estreito diálogo com temas
contemporâneos como a preservação ambiental, a saúde pública e a identidade nacional.
Uma obra viva, provocativa, pulsante, que mesmo centenária se mantém atual.
Qualquer semelhança com a situação das queimadas e dos habitantes do interior do
Brasil dos dias de hoje só pode ser mera coincidência…

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Referências:
https://www.unicamp.br/unicamp_hoje/ju/abril2002/unihoje_ju173lobato_pag07.html
https://www.overdadeirositiodopicapau.com.br/monteiro-lobato/
http://www2.assis.unesp.br/cilbelc/jornal/maio07/content24.html
http://educacao.globo.com/literatura/assunto/resumos-de-livros/urupes.html
http://www.nilc.icmc.usp.br/nilc/literatura/urup.s1.htm
https://escritoradesucesso.com.br/resumo-da-obra-urupes-%E2%94%80-contexto-
historicoanalise-e-personagens/ https://vestibular.brasilescola.uol.com.br/resumos-de-
livros/urupes.htm http://oficinafu.blogspot.com/2018/06/urupes-100-anos.html
https://www.coladaweb.com/resumos/urupes-monteiro-lobato

introdução do livro Urupês da Editora Globo